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domingo, 3 de maio de 2015

Dirigir bêbado é crime?


Decisão do STF confunde artigos do CTB que preveem infração administrativa e crime

A preocupação do Supremo Tribunal Federal (STF) com a embriaguez ao volante é muito acertada. Em 2010 alcançamos o patamar de 40 mil mortes no trânsito. A impunidade é generalizada, a irresponsabilidade de beber e dirigir precisa de punição efetiva, mas tecnicamente a decisão do Supremo que admitiu o perigo abstrato no crime previsto no art.

306 do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) é equivocada.

Para o STF o simples fato de dirigir embriagado já bastaria para a configuração do crime do art.

306 do CTB. Assim decidiu a 2ª Turma do referido Tribunal. Confundiu-se o crime do art. 306, que prevê a pena de 2 a 4 anos de prisão, com a infração administrativa do art. 165 do CTB, que sanciona o embriagado com multa, suspensão da habilitação, apreensão do veículo e pontuação na carteira de habilitação. (Veja quadro)

Uma primeira diferença entre eles é que o crime exige uma determinada taxa de alcoolemia (0,6 decigramas de álcool por litro de sangue). A segunda diferença é a seguinte: a infração administrativa só exige que o sujeito esteja embriagado; o crime exige embriaguez mais uma direção anormal, imprudente. O crime não exige dano e não é preciso que o motorista cause um acidente. Basta que ele coloque em perigo concreto a segurança viária. Não é preciso uma vítima concreta. Isso tecnicamente chama-se perigo concreto indeterminado. Se o sujeito dirige bêbado em ziguezague, se sobe uma calçada, se passa no sinal vermelho etc., coloca em perigo concreto a segurança no trânsito. É isso que caracteriza a essência do crime. Nada disso é necessário para a configuração da infração administrativa. Por que essa diferenciação? Porque o crime é punido com pena de prisão.

Dirigir bêbado é crime? Depende da forma como o bêbado dirigia. Se dirigia corretamente, sem colocar em risco concreto a segurança viária, pratica a infração administrativa do art. 165. Se dirige de forma anormal, imprudente, pratica o crime do art. 306. Não se fazendo essa diferenciação confunde-se a infração administrativa com o crime e é isso que foi feito pelo STF.

CÓDIGO DE TRÂNSITO BRASILEIRO

CAPÍTULO XV - DAS INFRAÇÕES

(...)
Art. 165.   Dirigir sob a influência de álcool ou de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência: (Redação dada pela Lei nº 11.705, de 2008) Infração - gravíssima; (Redação dada pela Lei nº 11.705, de 2008)

Penalidade - multa (cinco vezes) e suspensão do direito de dirigir por 12 (doze) meses; (Redação dada pela Lei nº 11.705, de 2008)

Medida Administrativa - retenção do veículo até a apresentação de condutor habilitado e recolhimento do documento de habilitação. (Redação dada pela Lei nº 11.705, de 2008)

Parágrafo único. A embriaguez também poderá ser apurada na forma do art. 277.

CAPÍTULO XIX - DOS CRIMES DE TRÂNSITO
(...)
Art. 306. Conduzir veículo automotor, na via pública, estando com concentração de  álcool por litro de sangue igual ou superior a 6 (seis) decigramas, ou sob a influência de qualquer outra substância psicoativa que determine dependência: (Redação dada pela Lei nº 11.705, de 2008)

Penas - detenção, de seis meses a três anos, multa e suspensão ou proibição de se obter a permissão ou a habilitação para dirigir veículo automotor.

Parágrafo único. O Poder Executivo federal estipulará a equivalência entre distintos testes de alcoolemia, para efeito de caracterização do crime tipificado neste artigo. (Incluído pela Lei nº 11.705, de 2008)

Luiz Flávio Gomes
Jurista e cientista criminal; fundador da Rede de Ensino LFG; diretor-presidente do Instituto de Pesquisa e Cultura Luiz Flávio Gomes; foi promotor de Justiça (1980 a 1983); juiz de Direito (1983 a 1998); e advogado (1999 a 2001). Acompanhe meu Blog. Siga-me no Twitter. Assine meu Facebook.

Alice Bianchini

Doutora em Direito pela PUC-SP; coordenadora do curso de pós-graduação em Ciências Penais pela Universidade Anhanguera-Uniderp; presidente do IPAN - Instituto Panamericano de Política Criminal.