Dívida
bilionária da União em repasses diretos, queda nos recursos para empresas
estatais e o estouro da Operação Lava-Jato deixaram municípios sem dinheiro a
um ano da campanha
Senado
aprovou na terça-feira projeto que alivia caixas públicos. Mudança, porém, só
entra em vigor em 2016
Brasília – A
pouco mais de um ano das eleições municipais, prefeitos de quase 90% dos
municípios do país estão sem dinheiro no cofre para realizar obras, comprar veículos
escolares, construir estações de tratamento de esgoto e saneamento ou prevenir
as encostas contra as chuvas. Levantamento feito pela Confederação Nacional dos
Municípios (CNM) mostra que o governo federal deve R$ 36 bilhões às cidades nas
operações que envolvem repasses diretos de recursos às prefeituras, o que
exclui, por exemplo, as obras do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC). A
inadimplência da União não envolve apenas os municípios, mas também redução de
repasses para estatais e autarquias.
Se o cenário
já é preocupante, o futuro, com o arrocho fiscal sinalizado pela equipe
econômica comandada pelo ministro da Fazenda, Joaquim Levy, deve levar o
governo federal a embolsar esse montante. No fim de fevereiro, o Decreto 8.407
autorizou a Secretaria do Tesouro Nacional a bloquear, em conta específica do
Sistema Integrado de Administração Financeira do Governo Federal (Siafi), todos
os restos a pagar não processados dos órgãos e entidades do Poder Executivo
federal inscritos até o exercício de 2014.
Somente no
fim de junho, parte desses recursos poderá voltar a ser disponibilizada. Mas só
para aquelas obras que já estiverem em execução. Os demais tendem a ser
incluídos na conta do superávit primário que a União precisará fazer até o fim
do ano, para que o Brasil recupere a credibilidade perante os investidores
estrangeiros. “Para os programas considerados vitrines do governo federal, como
o Bolsa Família e o Minha casa, minha vida, a União garante os recursos. Nos
demais casos, os prefeitos têm que se virar em dinheiro”, protesta o presidente
da CNM, Paulo Ziulkoski.
Ele diz que
o represamento das verbas prejudica programas importantes, como o Mais
educação. “Os prefeitos estão sem dinheiro para comprar ônibus escolares e
levar os alunos para a escola”, disse Ziulkoski. A CNM ainda está em fase final
de levantamento dos números, mas, segundo o presidente, os maiores devedores
são os ministérios da Educação, Saúde, Cidades e Integração Nacional.
"Os
prefeitos estão sem dinheiro para comprar ônibus escolares e levar os alunos
para a escola" - Paulo Ziulkosky, presidente da Confederação Nacional dos
Municípios (CNM)
Além dos
restos a pagar devidos aos municípios, o ritmo de repasse dos ministérios para
as empresas estatais — sobretudo aquelas responsáveis pela realização de obras
em todo o país — diminuiu em relação ao ano passado. Nos dois primeiros meses
deste ano, segundo o Contas Abertas, os repasses foram R$ 2,5 bilhões
inferiores se comparados ao mesmo período de 2014. A queda mais acentuada foi
verificada em relação à Petrobras. A maior empresa do país, engolfada pela
Operação Lava-Jato, apresentou um volume de investimentos de R$ 7,5 bilhões
este ano, ante R$ 13,27 bilhões no ano passado. O Sistema Eletrobras e a
Infraero, responsável pelas obras nos principais aeroportos brasileiros, também
sofreram as perdas.
PENDÊNCIAS
Procurado pela reportagem, o Ministério do Planejamento explicou que toda
despesa pública percorre as etapas de empenho (ato que cria ao Estado obrigação
de pagamento); liquidação (verificação do direito de crédito ao credor) e
pagamento (emissão de cheque ou ordem bancária em favor do credor). Segundo a
pasta, dos R$ 36,7 bilhões de restos a pagar, somente R$ 3,6 bilhões foram
liquidados. O restante (R$ 33,2 bilhões) não foi liquidado e, portanto, ainda
está pendente da entrega de produto, obra ou serviço por parte do fornecedor.
Por esta lógica, o governo federal não poderia ser considerado devedor.
Quanto à
diminuição no volume dos repasses das estatais, o Planejamento lembrou que “a
elaboração do orçamento anual ocorre no primeiro semestre de cada ano anterior
à sua execução” e que é “importante observar que os investimentos têm uma
lógica cíclica. As empresas estatais, em geral, estão em fase de conclusão de
investimentos, que demandam volumes maiores de recursos em sua fase inicial e
que se reduzem em fase final”. O ministério reconheceu, no entanto, que a
Petrobras reduziu seus investimentos no início de 2015.